quinta-feira, 6 de outubro de 2011



        Sentada numa cadeira dura, fria e gasta, ela encara o reflexo borrado num espelho rachado. Um milhão de demônios a atormentam. Provocam o extrapolar do limite.

            Os olhos castanhos vidrados manchados pela maquiagem negra, grandes demais para o pequeno rosto ausente de luz, tão pedintes de algo; numa súplica silenciosa que escorre num caminho de infinitas lágrimas.
            Cabelos negros encaracolados emolduravam a face e escorriam longos pelas costas da menina, que tentava encontrar-se na imagem quebrada do espelho antigo e enferrujado. Mas o que ela via?
            Os lábios róseos sujos pelo rubro batom – destoando das paredes amarelo-gasto do quarto, agora escuro, com cama de ferro descascado que range até com a brisa que entra pela janela de madeira escurecida que em seus dias de glória até poderia ser dita bonita – mudos numa sufocante vontade de grito, mas não recebendo nem bocejos; gemidos frustrados num idioma indecifrável; caroço na garganta.
            As mãos trêmulas de unhas tortas com esmalte barato descascado no que um dia foi um preto brilhante agarram torpes os braços finos e fracos num abraço que implora socorro a si mesmo. Num abraço sem calor, sem amor, sem nada.
Vazio.
            As pernas magras recolhidas junto ao peito coberto por uma camisa velha que há muito tempo foi azul-marinho, arrepiadas e geladas, porém dormentes. Dormentes como o coração da frágil moça que agora fecha os olhos, naquela mesma posição, ao sair do primeiro raio de sol e finalmente dorme.

3 comentários:

  1. Um texto que vale a pena ler cada vírgula. É como se tu entendesses o que eu sinto no momento, um vazio e uma angústia enroscados. Esplêndido.

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  2. Carol, vc é com certeza a pessoa que melhor escreve que eu conheço. abraço.


    Brother.

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