sábado, 11 de fevereiro de 2012

O Guarda-Chuva


— Parece que vai chover.
— Parece sim.
— Pra mim já chove há algum tempo...
— Por que não abres um guarda-chuva e te proteges?
— Tentei uma vez, mas a chuva me pegou pelos lados.
— Então você não tentou mais nada?
— Tentei, mas me senti preso. Faltava alguma coisa, sabe? — Ele deu de ombros.
— E se chover agora?
— Simples, eu vou me molhar.
— Você tem medo?
— Não mais. Aprendi a seguir em frente.
— Mas e a chuva? Você vai se molhar!
— Eu sei. Certas coisas não há como evitar.
— O que devo fazer com meu guarda-chuva então?
— Jogue ele fora, se quiser. É só chuva. Se molhe.
— Mas tem hora que parece gelar os ossos.
— Eu sei, mas o que seria a vida se não nos molhássemos de vez em quando?
— Você tem razão.
Joguei-o no lixo. A chuva caiu.

O Que Eu Queria?


Eu queria que todos esses rabiscos tivessem forma.
Eu queria que cada palavra saísse sem dor.
Eu queria que cada letra não saísse feito rasgo do meu coração.
Eu queria que de cada sussurro e cada suspiro saísse poesia.
Eu queria que todas aquelas lágrima não fossem em vão.
Eu queria a verdade, mas a verdade tem doído tanto que viver na mentira parece até um sonho.
Eu queria um abraço, mas o que chega é como mil tentáculos que me prendem, sufocam, até eu não poder mais.
Eu queria um beijo, mas as bocas que aparecem trabalham e se empenham em ferir, maldizer, tecer mentiras.
Eu queria o amor, mas no meio disso tudo perdi o rastro dele.
Mas isso... Isso era só o que eu queria.

Versos Íntimos

Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera -
Foi tua companheira inseparável!

Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.

Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!

                                                                      Augusto dos Anjos

Pra quê?



– Pra quê serve o amor?
– Certa vez me disseram que é o que mantém tudo junto.
– Mas vejo tanta gente separada...
– Vai ver não era amor.
– Dá pra saber quando é?
– Não sei, acho que dá pra sentir.
–O que você sente?
– Dor. Eu sinto dor.
– Dor? Dor de que?
– Dor de amor quando tenho que assistir você ir embora; dor quando você vira as costas e começa a andar para longe; dor quando você fecha os olhos e eu perco por uma fração de segundo todo aquele brilho; dor quando você está longe e não posso sentir seu perfume; dor quando só a memória frágil me traz uma mera cópia do seu sorriso... Mas nada se compara a dor da espera pela próxima vez em que te verei.

Os dois se entreolham.

–Parece que você não vai aguentar e que uma parte do seu coração se quebra e se cola... De novo e de novo. Não é?
– Você sabe...
–Sim, eu sei.
–Eu te amo.
–Eu te amo.

Talvez o amor sirva mesmo para manter tudo junto.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Estrelas, Teus Olhos.



Em noites assim que eu sinto mais a sua falta. Aqui sentada, encarando as estrelas, penso no quanto seria bom estar em seus braços.
Eu poderia dizer que a lua sussurra para mim, como tantos outros já disseram, mas é a sua voz que escuto tão perto do meu ouvido como uma suave carícia que ludibria meus sentidos, me fazendo acreditar que você está ao alcance das mãos.
O vento soprou agora, balançou meus cabelos e quase pude sentir como se fossem seus dedos. Sorri mesmo sem querer, mesmo para ninguém. Sorri para você que está aqui, sussurrando pela lua, me tocando pelo vento. Serão as estrelas teus olhos?
Quando fecho os meus, posso ver-te. Estarei louca? Não demore mais, preciso de tua real presença. Minha memória e imaginação não fazem jus. Vem para mim.

O Vestido Azul


Ela fechou os olhos e sentiu o vento fraco vindo de nenhum lugar soprando em seu rosto. Sentiu-se beijada pela brisa que acarinhavam os cabelos castanhos. Os lábios pequenos sorriram tímidos, num quase imperceptível movimento. Ela estava longe. Com um mar cheio de mistérios dentro do coração, que escondia grandes segredos, era constante o medo de se afogar em si mesma; de enredar-se por um caminho sem volta; de descobrir que o avesso era ainda pior.
Uma gota caiu das nuvens cinza que alheias a moça deitada na areia, choravam, escorreu pela bochecha pálida e sossegou nos lábios róseos. Começava a chover, mas ela queria sol. As gotas, agora mais severas, fustigavam a areia e encharcavam o vestido azul da menina. Ela não se importava com o tempo, envolvida numa excursão atrás do que há muito abrigava naquele oceano de superfície serena. Mergulhou.
Depois de tanto desejar, de tanto procurar, de tanto querer, abriu os olhos e enfrentou a tempestade. Limpou a areia grudenta dos braços, das pernas e se levantou. Ela conhecia a si mesma, sabia do mais profundo de si. Ajeitou o vestido azul molhado e foi atrás de um novo sol.